Vaticano inclui crimes sexuais no Código de Direito Canônico

Em 2019 mais de 190 líderes religiosos se reuniram em uma cúpula com o objetivo de buscar medidas eficazes no combate à violência sexual. Nas palavras do Papa Francisco: “Nossos corações estão cobertos pelo peso da responsabilidade pastoral e eclesial que nos obriga a discutir em conjunto, de modo sinodal, sincero e profundo, como lidar com este mal que aflige a Igreja e a humanidade. O povo santo de Deus olha para nós e não espera só condenações simples e óbvias, mas todas as medidas concretas e eficazes que são necessárias. É preciso ser específico.”

Nessa cúpula o Papa mencionou a importância do combate ao abuso sexual de crianças e dois anos depois, após o longo período de discussão acerca da revisão do Código Canônico, foram apresentadas as inovações trazidas e a reforma é a mais extensa em 40 anos.

Dentre as mudanças cumpre salientar aquelas que se referem ao abuso sexual de crianças e adolescentes, que agora possui um dispositivo próprio, inserido em uma seção intitulada “ofensas contra a vida humana, a dignidade e a liberdade”. Para o Papa, o objetivo de tal revisão é a redução do número de casos no qual a imposição da pena é deixada apenas à critério das autoridades, além de ser uma resposta aos fiéis que buscavam uma atitude por parte do Vaticano.

As sanções previstas trazem a possibilidade de suspender e punir não apenas os clérigos, mas todos os fiéis que possuem algum tipo de responsabilidade na igreja, mesmo que em tarefas auxiliares, que cometerem crimes sexuais. Nesse sentido, a revisão também prevê penas de redução de salários e a aplicação de multas, a serem revestidas em favor da vítima, bem como limita o poder de decisão dos bispos ao avaliar e impor castigos, sendo apresentados critérios para a identificação da pena cabível.

Além disso, também foram tipificadas pela reforma a execução dos crimes de corrupção de menores, conhecida como grooming, e posse de material contendo criança ou adolescente em cena de sexo explícito. Esta é uma reação importante do Vaticano contra uma das práticas que mais desacreditaram a Igreja Católica, tendo o Papa considerado evidente a necessidade desta mudança, visto que, segundo ele “Muitos foram os danos ocasionados no passado pela falta de compreensão sobre o relacionamento íntimo que existe na Igreja entre o exercício da caridade e a atuação da disciplina sancionadora”.

As revisões entrarão em vigor em 8 de dezembro de 2021, sendo considerada a reforma mais relevante feita ao Código Canônico desde 1983, quando entrou em vigor.

Antes da atualização, o Código Canônico tratava os crimes sexuais da seguinte forma:

TÍTULO V

DOS DELITOS CONTRA OBRIGAÇÕES ESPECIAIS

Cân. 1392 — Os clérigos ou os religiosos que exercerem comércio ou negociação contra as prescrições dos cânones, sejam punidos segundo a gravidade do delito.

Cân. 1393 — Quem violar as obrigações que lhe tiverem sido impostas por motivo de pena, pode ser punido com pena justa.

Cân. 1394 — § 1. Sem prejuízo do prescrito no cân. 194, § 1, n.° 3, o clérigo que atentar matrimónio, mesmo só civilmente, incorre em suspensão latae sententiae; e se, admoestado, não se emendar e persistir em dar escândalo, pode ser punido gradualmente com privações e ou até mesmo com a demissão do estado clerical.

  • 2. O religioso de votos perpétuos, que não seja clérigo, e atentar matrimónio, mesmo só civilmente, incorre em interdito latae sententiae, sem prejuízo do prescrito no cân. 694.

Cân. 1395 — O clérigo concubinário, fora do caso referido no cân. 1394, e o clérigo que permanecer com escândalo em outro pecado grave externo contra o sexto mandamento do Decálogo, seja punido com suspensão, e se perseverar no delito depois de admoestado, podem ser-lhe acrescentadas gradualmente outras penas até à demissão do estado clerical.

  • 2. O clérigo que, por outra forma, delinquir contra o sexto mandamento do Decálogo, se o delito for perpetrado com violência ou ameaças ou publicamente ou com um menor de dezasseis anos, seja punido com penas justas, sem excluir, se o caso o requerer, a demissão do estado clerical.

Cân. 1396 — Quem violar gravemente a obrigação de residência a que está sujeito em razão de ofício eclesiástico, seja punido com pena justa, sem excluir, depois de admoestado, a privação do ofício.

O texto completo com a nova reforma ainda não está disponível na internet. Assim que for disponibilizado postaremos aqui.

Acesse o Código Canônico completo em (Livro VI – das sanções na Igreja): https://www.vatican.va/archive/cod-iuris-canonici/portuguese/codex-iuris-canonici_po.pdf

 

– Nicoly Araújo

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